Tenho recebido muitos e-mails de leitores que estão (com razão) 
empolgados com a rentabilidade apresentada pelo Tesouro Direto nos 
últimos meses. Em 12 meses, a NTN-B Principal com vencimento em 2035 apresentou a incrível alta de 45,25% (37,03% só em 2012).
 E esse é só um exemplo, já que boa parte dos demais títulos 
apresentaram uma rentabilidade excessiva. Mas o excessivo otimismo 
decorrente desses resultados também tem seus perigos.
Entenda a variação do preço do Tesouro Direto
Muitos leitores têm perguntado se deveriam investir todos os seus 
recursos no Tesouro Direto, por conta dessa alta excessiva. E minha 
resposta, invariavelmente, tem sido a de que essa alta foi uma anomalia 
do sistema por causa da forte queda nos juros. A Selic começou 2012 em 
11% e hoje já está em 7,50% – uma queda total de 31,81%. Isso não é pouco. E isso afeta muito o mercado de juros, jogando o valor de face dos títulos lá pra cima.
Para entender o motivo, imagine que eu tenha R$ 100,00 e o empreste a
 você, cobrando 10% de juros ao ano. Isso significa que você pagaria, 
para mim, R$ 10,00 por ano. Mas digamos que você encontre uma outra 
fonte de empréstimo que cobra 5% de juros ao ano. Agora, você poderia 
pegar os mesmos R$ 100,00 pagando juros de R$ 5,00 por ano. Ou então — e
 aí está a chave do raciocínio –, você poderia pagar os mesmos R$ 10,00 
para receber não R$ 100,00, mas R$ 200,00. Em outras palavras, reduzindo
 os juros em 50%, você dobrou a sua capacidade de endividamento. Como a 
queda de juros foi generalizada, o valor do primeiro empréstimo disparou
 de R$ 100,00 para R$ 200,00.
Você continuaria a pagar R$ 10,00 na primeira situação (porque os 
juros eram de 10%) pelos R$ 100,00 que tomou emprestado; mas, como os 
juros caíram, é como se, financeiramente, sua dívida comigo tivesse 
disparado de R$ 100 para R$ 200. Isso ocorre, no Tesouro Direto, porque 
os juros pagos ao longo do tempo são reajustados no valor de face do 
título, conforme o fluxo de caixa futuro.
Outro exemplo: digamos que eu te empreste R$ 100,00 com juros de 10% 
(R$ 10,00 ao ano) a serem pagos em 10 anos. No total, você deveria me 
pagar R$ 100,00 (valor do título) mais R$ 100,00 (valor dos juros). Ou 
seja, em 10 anos, você deveria me pagar R$ 200,00. 
Digamos que os juros caíram para 5% e eu empreste os mesmos R$ 100,00 
para João, um amigo seu. Nessa situação, ele deveria me pagar R$ 100,00 
(valor do título) mais R$ 50,00 (valor dos juros), totalizando R$ 150,00
 daqui a 10 anos.
No momento da queda da taxa de juros, o valor do título é reajustado 
de maneira a compensar essa queda: o governo não faz o cálculo separado 
para cada um, conforme os juros forem sendo pagos. Ele reajusta o valor 
do título de modo a compensar as variações da taxa de juros. No nosso 
exemplo, isso significa que, no momento em que os juros caíssem de 10% 
para 5%, tanto João quanto você teriam  o valor dos juros reajustado 
conforme o preço pelo qual o título foi adquirido. O título de João 
continuaria a valer R$ 100,00 e ele receberia, no final, R$ 150,00 
(porque não sofreu qualquer queda, já que contratou o empréstimo a 5%).
Mas, para você que ajustou o empréstimo a 10%, isso significa que o 
governo, que antes devia R$ 200 para você ao final, agora deve apenas os
 mesmos R$ 150,00 que deve a João. Pra onde foram os R$ 50 restantes? 
Eles foram incorporados ao valor da dívida. Ao invés de
 pagar R$ 100,00 do valor de face da dívida, ele pagará R$ 150,00 por 
ela, mais R$ 50,00 em juros (os juros atuais), totalizando os R$ 200 
inicialmente ajustados. É por isso que o Tesouro Direto varia tanto o 
valor.
Tesouro Direto também tem períodos de baixa
O problema é que… essa lógica também funciona na ponta invertida. 
Quando a Selic aumenta, o valor dos títulos diminui. E se a Selic 
aumentar tão rapidamente quando vem caindo, o efeito pode ser 
desastroso. Por isso é que o atual momento (Selic na mínima) não é tão 
otimista para quem espera ganhar dinheiro dessa maneira, com a 
valorização dos títulos. A Selic está em 7,50% e dificilmente vai cair 
para 5% no horizonte de curto e médio prazos, porque a economia 
brasileira não aguentaria um estímulo tão forte (e o fantasma da 
inflação nos assombraria com muita força). Para cair os mesmos 31,80% 
que caiu entre janeiro e setembro, a Selic teria que despencar para algo
 em torno de 5% – e o efeito nos títulos seria idêntico ao que ocorreu 
nesse período.
A taxa de juros funciona, de certa maneira, como um elástico: quanto 
mais se puxa para um dos lados, mais difícil fica continuar a puxar. 
Como ela foi excessivamente puxada para baixo, é cada vez mais difícil 
diminuir os juros. Isso não significa dizer que ela vai voar como um 
elástico para cima, mas apenas que o Banco Central provavelmente terá 
dificuldades para fazer continuar esse movimento que trouxe 
rentabilidade excessiva no Tesouro Direto.
Ou seja: não espere auferir lucro com esses ganhos excessivos nos 
próximos meses e anos. Se houver uma alta na taxa, pode até acontecer o 
contrário, inclusive com rentabilidade negativa por alguns períodos. 
Invista no Tesouro Direto apenas se você se sentir confortável com os 
juros ajustados no momento do investimento, porque é o que você vai 
ganhar no fim do prazo. Esperar lucrar mais do que isso é apenas para o 
curto/médio prazo e com muita análise dos movimentos do Banco Central – 
algo que dificilmente é fazer com 100% de certeza.
Fonte: Fabio Portela
 
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