“De raiz humilde, venceu nos gramados para se tornar um fenômeno 
nacional. Mas apesar de ter enriquecido, nunca quis sair do seu bairro 
de origem, o Divino, onde é venerado como uma lenda viva.[...] É honesto
 e generoso, um verdadeiro homem de família”. Nesta breve descrição do 
personagem Tufão, retirada do site oficial
 da novela Avenida Brasil, alguns consultores financeiros já poderiam 
tirar conclusões sobre erros e acertos que o protagonista comete ao 
administrar suas finanças e que são exemplos do que acontece com muitas 
pessoas que recebem ou acumulam grandes fortunas na vida real. 
 Não seria exagero dizer que Tufão, com seu estilo de vida sem grandes 
ostentações, realmente administra sua fortuna muito melhor do que uma 
série de jogadores de futebol e outros endinheirados que na vida real 
chegam à aposentadoria falidos. Quem acompanha a novela percebe que de 
fato o personagem prefere viver uma vida sem muita gastança, sem viagens
 caríssimas, apenas com as modestas idas e vindas a Cabo Frio e 
"cervejinhas" com petiscos no boteco do Divino.
 Por outro lado, a afeição exacerbada pela família e principalmente por 
sua mulher Carminha, a vilã da novela, o levaram a cometer alguns 
deslizes financeiros que não seriam perdoados na realidade, como 
permitir que a esposa gaste os recursos da família sem qualquer 
moderação. Essa espécie de ingenuidade leva muitos milionários e bilionários
 da vida real a confiarem em aproveitadores ou em familiares e 
conhecidos que, mesmo sem más intenções, o levam à bancarrota por falta 
de educação financeira.
 Quem enriquece muito rápido, se aposenta muito cedo ou tem uma renda 
irregular, como atletas e alguns artistas, fica em uma situação ainda 
mais frágil nesses casos.
 Com foco exatamente neste tipo de problema, William Machado, ex-capitão
 do Corinthians, iniciou este ano um projeto de consultoria financeira 
para jogadores em parceria com a Baum Investimentos. Antes de se dedicar
 à carreira de jogador, William cursou alguns anos a faculdade de 
Ciências Contábeis e pensa em voltar para finalizar a graduação. 
 Em entrevista a EXAME.com, William destacou alguns erros de Tufão que 
aparecem como um pano de fundo na novela, mas que poderiam se tornar uma
 trama à parte na vida real. 
 Problemas no casamento
 Tufão e Carminha foram casados por 13 anos e apesar de a trama não 
detalhar qual foi o regime de bens do casamento, fato é que a vilã 
poderia facilmente ter levado Tufão à falência, não fossem alguns 
percalços em seus planos.
 No mundo real, talvez não de forma tão criativa, também os casamentos 
muitas vezes deixam os jogadores e outros milionários em situações 
financeiras difíceis, diz William. Ele explica que o matrimônio em si 
não é o problema, mas sim o fato de muitos se casarem no regime de 
comunhão de bens. Como a carreira dos atletas dura 14 ou 15 anos, 
encerrando-se na faixa dos 35 anos, a cessão de metade dos recursos à 
ex-esposa torna-se um fardo pesado, principalmente quando aliada à 
aposentadoria precoce.
 No Brasil, os casamentos normalmente são realizados em comunhão parcial
 de bens, regime no qual os bens adquiridos por um dos cônjuges ou pelos
 dois durante o casamento são repartidos após o divórcio, ficando de 
fora os bens e rendimentos auferidos antes do casamento. Mas alguns 
casais preferem se casar em separação total de bens, fazendo, para isso, um pacto pré-nupcial.
 Quem não quer a separação total pode usar o pacto pré-nupcial para 
customizar o regime de bens, partilhando apenas a parte do patrimônio 
designada. Quem já casou pode inclusive modificar esse regime de bens 
por um pacto pós-nupcial, se for de comum acordo dos cônjuges.
 Ainda que menos providos de dramaticidade, a vida real está repleta de 
pessoas como Carminha e seu amante Max, diz William. E quanto maior a 
fortuna em questão, maior o número de aproveitadores. Os oportunistas 
aparecem como amigos, conselheiros ou chegam até sem dar explicações, 
oferecendo ajuda para gerir as finanças, comprar um carro ou mesmo 
propor sociedade em um novo negócio. O preço pelos "favores", no 
entanto, é alto.
 Empenhados quase 100% do tempo na carreira e com pouco tempo para 
cuidar das finanças, jogadores de futebol e outros endinheirados acabam 
muitas vezes fazendo as escolhas erradas e confiando em quem não 
deveriam, explica William Machado. “Algumas pessoas realmente têm mau 
caráter e acabam se aproveitando. Mas outros nem têm más intenções, mas 
acabam dando maus conselhos por inexperiência”, completa.
 Para qualquer pessoa que tenha um grande patrimônio - e principalmente 
aquelas com uma vida profissional atribulada - é altamente recomendável a
 busca de profissionais especializados em gestão financeira. Administrar
 uma grande fortuna é como gerir uma empresa, sendo muito difícil para 
os leigos fazê-lo da melhor forma. 
 Entre os profissionais mais indicados para este perfil estão os administradores de carteira de valores mobiliários,
 que fornecem tratamento personalizado ao cliente, podendo inclusive 
administrar um fundo exclusivo para um único investidor. Eles fazem 
planejamento sucessório e perpetuação de patrimônio e atuam dentro de 
dois tipos de estruturas financeiras: o Private Bank (private), voltado a
 clientes com investimentos superiores a um milhão de reais e oferecidos
 por bancos de varejo e de investimentos; e o Family Office (family), 
para patrimônios de cinco a 10 milhões de reais, que funcionam de forma 
independente, sem ficarem presos às ofertas de serviços dos próprios 
bancos.
 E quem tem um grande patrimônio, mas não necessariamente acima de um 
milhão de reais, pode recorrer também a um planejador financeiro. O 
ideal é buscar um profissional com mais reputação no mercado, que pode 
cobrar um valor mais alto, mas oferecerá também uma consultoria mais 
refinada, segundo especialistas.
 Famílias que mais atrapalham do que ajudam
 Segundo William Machado, não só nas novelas algumas famílias atrapalham
 mais do que ajudam. Ele explica que existem duas situações clássicas em
 que os laços familiares destroem as finanças dos jogadores. Uma delas 
consiste nos parentes que acham que podem desfrutar do mesmo padrão de 
vida do mais rico da família, caso de Muricy, a mãe de Tufão.
Ajudar o pai e a mãe não é o problema, e é natural que os filhos 
retribuam o esforço de toda uma vida. Mas há casos que podem ser 
destrutivos. Muricy, por exemplo, pede ao namorado Adauto que não 
trabalhe, dizendo-lhe que o filho poderia bancar os dois sem problemas. 
“Este é um ponto muito delicado. É óbvio que vai de cada um ajudar ou 
não, é algo muito pessoal, mas o jogador não pode ser visto como o 
salvador da pátria, ele também está batalhando, está vivendo longe da 
família e se dedicando”, explica William Machado.
 Segundo ele, quando os consultores financeiros orientam os atletas, 
perguntam qual é a renda que os clientes desejam ter durante a 
aposentadoria para traçar um planejamento financeiro. “Nós mostramos 
quanto eles precisam economizar para obter essa renda e explicamos que 
se eles quiserem gastar mais ajudando parentes ou amigos isso vai fazer 
falta para eles no futuro”, afirma.
 A segunda situação fatal para as finanças, que faz mais o gênero de Max
 e Carminha, é quando os parentes se propõem a administrar os negócios 
do jogador, ou a criar uma sociedade com ele. Na novela, por exemplo, 
Max pediu a Tufão dinheiro emprestado para investir em uma agência de 
publicidade, e o ex-jogador acabou no prejuízo. Na vida real, conforme 
William explica, os parentes mal intencionados não chegam a ser o 
principal problema, mas ironicamente quem afeta mais os jogadores são os
 bem intencionados inexperientes ou desinformados.
 “No intuito de ajudar, o parente causa um grande problema. É muito 
comum que o irmão do jogador tenha um amigo e que esse amigo influencie o
 irmão para se aproveitar da fortuna do jogador”, conta William.
 O capítulo de terça-feira (16) da novela ilustrou como a família, mesmo
 sem intenção, pode acabar trazendo problemas para o familiar mais rico.
 A irmã de Tufão, Ivana, comentou na frente de Carminha que a família 
está comprando um shopping no Divino. A vilã conversou com seu pai 
Santiago sobre o investimento e agora ambos estão tramando um plano para
 se aproveitar do novo negócio. Um claro exemplo de como a ingenuidade 
ou a falta de experiência no negócio pode trazer prejuizos.   
 Imóveis e outros investimentos feitos na emoção
 Mesmo depois de rico, Tufão fez questão de manter-se em seu bairro de 
origem, o Divino, e suas paixões o levaram a uma vida mais modesta do 
que as de outros endinheirados. Porém, essa atitude também é sinal de 
que o ex-jogador se deixou levar pela emoção, o que pode ser destrutivo 
quando se está lidando com dinheiro. Principalmente se também falta 
conhecimento.
 O ex-capitão do Corinthians explica que muitos jogadores acabam morando
 em várias cidades ao longo da carreira e compram um imóvel em cada 
lugar, pois consideram que pagar aluguel é jogar dinheiro fora. Porém, 
explica William, normalmente é melhor morar de aluguel e investir o 
restante do dinheiro em aplicações mais líquidas. "O sujeito tem 22 anos
 e diz que vai comprar o imóvel para servir-lhe de moradia quando se 
aposentar, aos 35 anos. Mas até lá a dinâmica da região já mudou, a 
arquitetura do apartamento fica ultrapassada, e o imóvel desvaloriza. O 
lado emocional é sempre um entrave muito grande e os leva a fazer maus 
negócios”, comenta.
 Há também quem compre imóveis pensando no investimento, mas sem 
conhecimento algum. Resultado: a compra é feita na alta e a venda, na 
baixa. William relata que conheceu um jogador dono de 15 imóveis no auge
 de sua carreira. Depois de aposentado, só lhe restava uma propriedade. 
As demais perderam o valor ao longo dos anos e foram vendidas.
Fonte: Exame
 
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